terça-feira, 16 de agosto de 2011

O tato pode enganar o paladar?

Será que o tato é capaz de influenciar como percebemos os alimentos? Não? Sim? Se não, então por que apalpamos as frutas quando vamos comprá-las? Por que aquela batata frita tem que estar crocante para ser tão gostosa? Se ela não estiver crocante o sabor mudará?

É para testar estas questões que a indústria alimentícia gasta alguns bilhões para desenvolver produtos com características bem específicas.

O pesquisador Michael Barnett-Cowan, do Instituto Max Planck na Alemanha, testou se é possível mudar como um alimento é percebido na boca apenas alterando a sua consistência ao toque das mãos. Parece complicado, não? Mas foi um procedimento bem simples.

A primeira coisa que o pesquisador fez foi comprar pacotinhos de pretzels (foto abaixo). Alguns pretzels ele colocou em água para alterar suas características e os deixou secar em condições ambiente. Os outros ele deixou como estavam no pacote.


Figura 1. Exemplo de pretzel utilizado na pesquisa. Todos foram retirados da mesma embalagem para garantir que tivessem as mesmas características (frescos e crocantes). Fontes das imagens GermanDeli (esquerda) e Mrs. Wheeler´s (direita). *A marca do salgadinho foi apagada.


Todos os pretzels imersos em água foram secos com papel toalha e depois deixados para secar nas condições ambiente por 30 minutos. Após este tempo eles estavam mais macios, porém intactos e secos.

A tarefa era muito simples. O participante ficava de olhos vendados e segurava um pretzel entre o indicador e o polegar da mão dominante (aquela que você mais usa). Depois ele dava apenas uma mordida com os dentes da frente em outro pretzel e despois cuspia o pedaço.

Havia duas condições para a tarefa: congruente ou incongruente. Na condição congruente o participante segurava e mordia pretzels não-tratados (não imersos em água), ou tratados (imersos em água). Na condição incongruente o participante segurava um pretzel tratado e mordia um não-tratado, e vice versa.

Os participantes avaliaram verbalmente quão fresco e crocante era o pretzel mordido, dentro de uma escala de pontos. Os resultados foram muito interessantes: 1) quando o participante mordeu e segurou um pretzel não-tratado (não imerso em água) ele o julgou muito fresco e crocante; 2) mas quando mordeu e segurou um pretzel tratado (imerso em água) o participante o julgou muito pouco fresco e crocante.

Por outro lado, os resultados ficaram mais interessantes quando foram misturados pretzels tratados e não-tratados: 3) quando o participante mordeu um pretzel não-tratado e segurou um tratado, ele o julgou menos fresco e crocante que na condição 1 (em que também mordeu um não-tratado); 4) quando ele mordeu um pretzel tratado mas segurou um não-tratado, ele o julgou mais fresco e crocante do que os pretzels da condição 2! Isso é mais intrigante porque nas duas condições ele mordeu um pretzel tratado, a única coisa que mudou foi o pretzel segurado na mão.

Os resultados de 3 e 4 indicam que o tato modula como o alimento é percebido na boca! Bastou trocar o tipo de informação recebida na mão para o participante dizer que um pretzel, antes julgado como pouco fresco e crocante (2), passasse a ser considerado mais crocante e fresco (4).

Apalpar os alimentos nos permite constatar a consistência, a textura e verificar se eles estão bons para o consumo. Evolutivamente isto teve uma importância fundamental para sobrevivência de nossa espécie, pois permitiu que não comessemos alimentos estragados que poderiam nos matar.

Hoje existe uma quantidade enorme de produtos industrializados e nossa escolha é feita com base na embalagem e no preço do produto. O parâmetro que temos para saber sobre a qualidade dele é a data de validade. Apesar de não podermos tocar o que iremos comprar, a indústria ainda gasta muito dinheiro desenvolvendo novos produtos que agradem não apenas ao paladar, mas aos outros sentidos também.

Na próxima vez que for a uma lanchonete, preste atenção na batata-frita, se ela estiver crocante ficará mais gostosa? E se ela estiver murcha, você acha que ela terá o mesmo  sabor?

Quer baixar o texto? Clique aqui.


Bruno Marinho de Sousa
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Mais sobre o assunto:

Barnett-Cowan, M. An illusion you can sink your teeth into: Haptic cues modulate the perceived freshness and crispness of pretzels. Perception, 39, pp. 1684-1686, 2010.

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